A cada 10 reais que o Sistema Único de Saúde (SUS) cobra dos planos de saúde, 3 não são pagos. Entre 2001 e 2019, o SUS pediu o ressarcimento de R$ 5,7 bilhões. Desse total, 4 bilhões foram efetivamente pagos (ainda que de forma parcelada). Sobram, ou melhor, faltam 1,7 bilhão. A conta é da Revista Piauí. O valor que os planos deixaram de pagar, informa a revista, equivale ao gasto pelo poder público com mais de 1 milhão de pessoas de 2013 a 2018 (número de vítimas do trânsito no período).
“Muitos brasileiros pagam por um plano de saúde e na hora de usar, descobrem que, na verdade, não têm plano algum, foram enganados”, critica o vereador Celso Giannazi. “Então eles procuram atendimento no serviço público. E é justo que o SUS depois cobre de quem oferece e não entrega o serviço”, ressalta.
Público versus Privado
O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em 2018, que a política de reembolso é constitucional. Já que o plano seria obrigado a oferecer o atendimento particular e não o faz. O câncer de mama, ainda de acordo com a Revista Piauí, foi o principal atendimento do SUS para usuários de planos de saúde entre 2001 e o primeiro semestre de 2018.
Em entrevista publicada em setembro do ano passado, Ligia Bahia, professora associada da Universidade Federal do Rio de Janeiro, diz que os planos se organizam para questionar a decisão do STF, reduzir ainda mais o poder da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) e aumentar a margem de lucro.
“A proposta das operadoras é a desregulamentação das coberturas, restrição radical da escolha de prestadores de serviços, não ressarcimento ao SUS, fim das penalidades impostas pela legislação e redução do poder de definição de reajustes de preços e fiscalização da ANS. Ambicionam vender mais planos. Planos sem atendimento a emergências, realização de exames, diagnósticos e tratamentos para cânceres”, explica.
Subfinanciamento
“Para fortalecer o SUS é necessário encarar o fato de que somos mais de 200 milhões de habitantes, a maioria de renda baixa e média e não podemos entregar a saúde para grupos empresariais, que são atraídos aos locais em que se situam segmentos de maior renda e não pelas condições sanitárias prioritárias”, lembra Ligia Bahia.
“O financiamento e a gestão do SUS precisam ser revistos. O SUS requer um volume de recursos muito superior ao atual, que poderiam ser obtidos com o fim dos subsídios públicos ao setor privado. A modernização da gestão, incluindo fim das influências político-partidárias para a nomeação de cargos técnicos, avaliação, prestação de contas e transparência, é tarefa inadiável”, defende.
Ligia Bahia, graduada em medicina, tem mestrado e doutorado em Saúde Pública pela Fundação Oswaldo Cruz e é co-autora do livro “Planos e seguros de saúde. O que todos devem saber sobre a assistência médica suplementar no Brasil” (Editora Unesp, 2010).